domingo, 30 de agosto de 2009

A Loucura e o Desconhecido IV

Nunca pensei na vida do modo que todos pensam. Buscava uma lógica, uma explicação, ou uma teoria em tudo ao meu redor, como um artifício a que eu me apegava para aceitar as condições e a completa falta de certeza de tudo. Vemos a vida como a dádiva suprema, que deve ser valorizada e cuidada sempre, sofrendo e nos submetendo a infinitas regras que vão contra aos nossos princípios e à nossa natureza. Se não somos oprimidos por nossos atos ao seguir nossos instintos humanos e simplesmente viver, somos, ao contrário, pressionados a viver intensamente e aproveitar cada momento, pois nos dizem que a vida é curta e não podemos perder nada. Somos obrigados a sorrir e ser feliz, mantemos uma vida vazia, e fazemos tudo de forma mecânica, sem pararmos para entender ou buscar um sentido para isso.
Não vejo clareza nesse amontoado de pensamentos sem conteúdo. Nunca acreditei na idéia de aproveitar a vida cegamente, e nunca pude enxergar o seu sentido maior. Encontrei-me num impasse em que não via sentido no viver, ao mesmo tempo que, ao contrário do que se pode pensar, não via sentido em acabar com esse viver. A minha vida, que sempre se baseou na busca da razão das cosias, entrou num paradoxo em que ela própria não tinha uma razão para ocorrer. Aconteceu que, se nunca encontrei um sentido, a falta de sentido acabou se tornando ele próprio.
A noite com Alice me fez entender e concluir minha inquietação dos últimos dias. Andei pensando em tudo que tenho e desprezo, em tudo que desejo sem saber porque. A tentativa desesperada e cega de me sentir vivo novamente, e sem a culpa de desprezar a nossa dádiva preciosa, tornou minha vida tão automática e inerte que nenhuma das minhas ambições e dos meus desejos eram mesmo meus. Sem perceber, perdi o controle sobre mim e meus pensamentos, sobre as pequenas vontades e os maiores princípios. Parei de pensar ou refletir sobre os meus atos, me tornando, assim, um ser vazio, sem conteúdo, sem vida.
Meu colapso se deu quando enfim percebi o caminho que estava tomando. Fiquei sem forças, me senti frágil. Me faltou vida, me faltou existência, me faltou o que mais tinha esquecido: eu mesmo. E de repente, não havia mais pensamentos. Nem os dos outros. Por não saber se eram realmente meus eu automaticamente os ignorava, com medo de me sentir oco e sem capacidade de seguir o que eu mesmo queria. E o que eu queria?
Bem, a grande questão era se eu queria alguma coisa. E Alice, sem querer, me ajudou a entender que minha busca por entendimento e por vontades próprias não chegaria a lugar algum, pois, na verdade, eu não tenho vontades, não tenho desejos, não tenho pelo que ir atrás. Sou mesmo oco, e não preciso querer o que não quero. Sei apenas o que sinto no meu redor, e da forma mais bruta, sem adaptações desnecessárias ou explicações sem sentido. Não preciso buscar teorias no que está tão claro na minha frente, não preciso entender ou mudar nada. Minhas sensações são genuínas, e mostram tudo da melhor e mais verdadeira maneira. Se o vento bate no rosto, se o suor corre pelo corpo, se é claro ou escuro, se é quente ou frio. Um tapa, um afago, um soco, um beijo. Dor. Prazer. Está tudo ali, e se é preciso que doa, que faça sofrer, que machuque para se sentir, então que seja. Foi assim que a aparente total falta de sentido se tornou o verdadeiro sentido. Me libertei das pressões e das vontades falsas, me libertei do sentimento de culpa, me libertei da vida. E de uma hora para outra, vi que a ela não é para mim.

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