domingo, 30 de agosto de 2009

A Loucura e o Desconhecido V

Permanecia totalmente entretido pela claridade inicial do dia. Estava na sacada da sala de cima, lugar isolado da casa e com vista para o gramado – diversão de outrora - e para o nascer do sol. Os raios chegavam cada vez mais para acalmar meu eu perturbado e quase inexistente. Me sentia tão leve e tão vivo que o tempo parecia ter parado, num momento único de clareza pessoal que acabava de dar rumo à minha vida, e ironicamente, o caminho era o fim. Somando os efeitos alcoólicos da noite anterior, que continuavam atuando, ao forte vento matinal que batia no rosto, minha visão ficava realmente embaçada. Não via a paisagem definida na minha frente, via apenas as cores se misturando no chão, indo para o horizonte, e se perdendo em novas cores no céu ainda nublado e claro que se formava. O tempo ruim prolongava a transição noite-dia, e todo aquele jogo de sensações brincando comigo e provocando cada canto do meu corpo me fazia quase flutuar.
Encostado na grade e vendo quão alto era ali, abri os braços e fechei os olhos como se me entregasse para aquele vento que apitava no meu ouvido e arrepiava até minha alma, e era como voar. Não sei como é voar, mas com certeza não é algo muito longe daquilo. Por um momento lágrimas escorreram pelos lados, e do choro emocionado no primeiro momento, sem que eu pudesse perceber, parti para um choro desesperado, molhado, e totalmente sincero. Estava agora jogado no chão, soltando tudo que se prendeu dentro de mim durante todo esse tempo de passividade e frustração, e que agora podia liberar por completo em um desabafo acumulado que explodia e crescia a cada segundo. Era um choro desejado, de alguém que nunca conseguiu se abrir e, simplesmente, se deixar levar. Não por falta de vontade, e muito pelo contrário, sempre foi uma necessidade vomitar as minhas bagunças mentais e limpar um pouco o que havia dentro de mim, mas sempre tive uma enorme trava segurando tudo isso. Naquele momento, junto das infinitas lágrimas e dos sentimentos perdidos, expulsei o tal ser que vivia dentro de mim fiscalizando e oprimindo a minha vida. Fiquei mais leve, e estava então pronto para o passo final.
Aquela erupção emocional deu lugar a uma calmaria que chegava a ser assustadora. Minha mente estava muda, nada se manifestava em um silêncio que daria medo se não fosse exatamente o que eu precisasse. Era como andar por uma praia imensa, quase sem fim, sentindo a maré batendo bem de leve e a brisa escorregando pelas curvas do meu corpo, com o azul limpo do céu me hipnotizando e me guiando, e sem ouvir um único e mínimo ruído. Nada, simplesmente mudo. Estava focado nos preparativos do mais importante acontecimento da minha vida, e ia sentir cada mísera parte de todo o processo, que na verdade nem era algo longo ou complexo, mas que para mim, a partir daquele momento, significava uma saborosa imensidão a minha frente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário